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Fala, Jornalista: Marcos Bragatto conta como é trabalhar com música

Atualizado: 6 de abr. de 2023

Apaixonado por Rock 'n' Roll, e com um currículo recheado, Marcos Bragatto já cobriu grandes festivais de música, como Rock in Rio e Lollapalooza. Além de publicações em grandes veículos de comunicação, realizou entrevistas com as lendas Ozzy Osbourne e Steven Tyler. Graduado em jornalismo pela Faculdades Integradas Hélio Alonso (FACHA-RJ), ele também é crítico musical, e produziu para a revista Billboard e os jornais Folha de São Paulo e O Globo. Bragatto também escreve para o Rock em Geral, site criado por ele, para publicar críticas e outros conteúdos voltados ao mundo da música.


Em entrevista para o "Fala, Jornalista!", série da Agência Mediação que traz experiências de profissionais da área, Marcos Bragatto falou sobre os desafios de exercer o jornalismo e sua trajetória.


(Foto: Adriana Vieira)


Sobre iniciar no jornalismo, Bragatto diz que "chegou atrasado". Ele conta que deixou de lado sua vocação na juventude por questões de emprego e sobrevivência imediatos e começou na prática, escrevendo para fanzines e revistas independentes, no início da década de 1990, de forma gratuita. "Virei fotógrafo, passei a colunista em umas [publicações], editor em outras, até escrever para publicações de grandes editoras com boa remuneração. Publiquei em praticamente todas as revistas especializadas em rock/música pop na época, além de eventualmente em alguns jornais e sites de renome", explica.


Confira a entrevista completa:

Por que decidiu trabalhar com jornalismo? A paixão pela música e pelo rock em particular me levou ao jornalismo. Na adolescência/juventude eu vivia lendo críticas, matérias, entrevistas e tudo o mais em revistas especializadas, e sempre me via como um dissidente em parte de tudo o que lia, ficando com aquela sensação de que 'preciso mostrar que o que esse sujeito tá falando tá errado' ou 'se ele pode fazer eu também posso'. Quando trabalhava na fiscalização de obras civis, preenchia relatórios com textos com um tom mais jornalístico/crítico do que técnico, então vi que precisava experimentar outra área para ver se dava certo.

Antes e depois do jornalismo: como a profissão te transformou? De tanto ler jornal e revista eu já vim pronto de fábrica, já sabia antes de saber. O que a faculdade me deu foi a técnica jornalística, preciosíssima nesses tempos de fake news, e a profissão, a experiência do contato com profissionais mais experientes com quem se aprende muito. Trouxe também alguma decepção, de ver como as coisas funcionam na prática, sobretudo no mundo corporativo.

Para você, qual é a importância do jornalismo de crítica musical e em que essa vertente contribui? Já contribuiu muito, mas hoje, lamentavelmente, a crítica musical está meio sem razão de ser. Antes, os artistas e gravadoras alimentavam os críticos com antecedência, às vésperas de um lançamento, e eles faziam o trabalho de dar uma espécie de parecer, para que as pessoas se baseassem em ouvir ou não ouvir, comprar ou não comprar esse material. Daí a expressão 'formador de opinião'. Depois que a música ficou grátis e a internet deu a todas as pessoas 'uma opinião' instantânea, a crítica perdeu a razão de ser. Porque em vez de ler um texto para saber como é uma música, o sujeito ouve logo a música e já tem sua própria opinião, sempre melhor que a de outra pessoa, claro, porque agora, nesses tempos estranhos, parece que todo 'mundo sabe tudo', e o profissional 'não sabe nada'. Por vezes quando uma crítica é publicada, todo mundo já ouviu o material da análise, e assim, repito, perde o sentido. É uma mudança de lógica do mercado na qual a crítica precisa se reinventar. Como isso vai acontecer não faço a menor ideia.

(Foto: Bruno Eduardo)

Quais são os maiores desafios para se tornar um jornalista crítico musical? Primeiro é saber escrever com alguma técnica e um bom vocabulário, senão o texto não para em pé e uma crítica fica parecida com outra, fica tudo repetitivo. Depois, ter uma bagagem musical satisfatória, ou seja, ter ouvido muita música, daquele subgênero e de outros, para ter referências na hora de analisar um novo trabalho. E, ainda, pesquisar sobre aquele artista, porque não é possível falar de um trabalho de um artista sem conhecer o que ele vem fazendo nos últimos tempos, sem relacionar esse novo trabalho com a trajetória dele, no mínimo a mais recente. Por último, se distanciar ao máximo de questões pessoais entre o crítico e o fã. Bem, não são bem desafios, mas o beabá da profissão. E quais são os critérios adotados na hora de escrever uma crítica? É preciso ter quais tipos de cautela? O principal é se fazer entender, ou seja, deixar o leitor da crítica com uma noção de que tipo de trabalho é aquele, como e porque o artista chegou a ele, e qual a importância/relevância desse trabalho. Se vale ou não a pena escutar, se traz renovação, se é importante em um cenário que ele habita. Nas artes, de um modo geral, e na música em particular, tudo é muito subjetivo, o que faz dessa tarefa, que parece simples, bastante difícil. Às vezes, uma crítica destaca pontos positivos de um trabalho, e outra salienta esses mesmos pontos como negativos. Manter um equilíbrio entre o 'ranzinza que detesta tudo' e o 'empolgadão que gosta de tudo' é também uma boa medida. Você já contribuiu para muitos veículos jornalísticos. Como chegou até o Rock em Geral? Quando eu colaborava com muitos veículos impressos e a internet engatinhava, sem conexão de alta velocidade, muitas pautas que eu sugeria/fazia não eram publicadas, ou saíam editadas. Então criei o Rock em Geral como um blog para ter todo o meu trabalho, na íntegra, em algum lugar. Com a decadência do impresso eu transformei o blog em um site cheio de seções, como se fosse uma revista digital, ele ficou enorme, sempre alimentado só por mim. Assim como a música ficou de graça e perdeu o valor, os textos também perderam espaço. Se ninguém quer ouvir música, imagina ler sobre música? Assim, o site está quase todo parado, exceção feita por coberturas de shows que eu faço com alguma regularidade.

Qual foi o seu melhor trabalho no jornalismo? Melhor eu não sei. Mas me orgulho de algumas matérias, como a entrevista que fiz com o guitarrista do Macaco Bong, Bruno Kayapy que ajudou a expor o esquema perverso do grupo Fora do Eixo na cena independente, assunto importante na época. Também de algumas entrevistas com medalhões do rock, ídolos da vida toda, como Ramones (essa exclusiva, feita na raça), Ozzy Osbourne, Steven Tyler, David Coverdale, Geddy Lee e Alex Lifenson, entre tantos outros. De furos como a volta de Bruce Dickinson ao Iron Maiden; a dissidência da ABRAFIN (Associação Brasileira de Festivais Independentes); o anúncio de turnê de artistas internacionais em primeira mão. E de criar algumas expressões repetidas pela grande imprensa, como 'micareta indie', por exemplo. Mas o que mais me orgulho é de ter hoje o melhor texto de cobertura de show de rock do Brasil. E digo isso sem a menor cerimônia. O que ainda gostaria de realizar como jornalista? Seguir cobrindo shows e festivais de rock, enquanto me deixarem entrar e a minha saúde resistir. O melhor da profissão: Cobrir show de rock. Inspirar as pessoas também. Muita gente me diz que se decidiu pela profissão por ter contato com o meu trabalho. É um exagero, claro, deve haver outros motivos, mas é um retorno que faz bem. E de algum modo garante a roda girando, já que comigo foi um pouco assim também. O pior da profissão: Transcrever entrevista.

Seus ídolos e inspirações no jornalismo? Meus ídolos estão quase todos no rock, né? Ademais sou um crítico vocacional, sempre vejo defeito em tudo. Mas fui e sou influenciado pela Rádio Fluminense FM, que catapultou o rock na década de 80; pelas revistas Bizz, Roll e outras da época, com todas as suas idiossincrasias; e pelo sem número de fanzines da década de 80 em diante. Mas posso citar, para o bem ou para o mal, nomes como Leonardo Pimentel, André Barcinski, Tom Leão/Carlos Albuquerque, Jamari França, Ricardo Alexandre, Sérgio Martins, Pedro Só e tantos outros como grandes referências. E é de Pedro Bassan o melhor texto da televisão brasileira.

Um recado para os futuros jornalistas: Leiam cada vez mais sobre tudo, não abandonem o conhecimento e jamais neguem os fatos.

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